Projeto mapeia prejuízos para o trabalhador e a Previdência causados pela subnotificação de doenças ocupacionais

 
O projeto Caminhos do Trabalho, realizado numa parceria entre o Núcleo de Estudos Estruturais da Faculdade de Economia e a Faculdade de Medicina da Bahia com a cooperação do Ministério Público do Trabalho (MPT), atua mediante o atendimento de trabalhadores adoecidos do setor de teleatendimento (call center), na região da Grande  Salvador. Tem como objetivo mapear a subnotificação das doenças ocupacionais e acidentes de trabalho no setor, a fim de evidenciar esse vício do mercado de trabalho brasileiro que “favorece a demissão de trabalhadores doentes e causa prejuízo de dezenas bilhões de reais para a Previdência Social”, explicou o professor da Faculdade de Economia Vítor Filgueiras, que é um dos coordenadores do Projeto.  De acordo com ele, “a estratégia é extremamente comum e pessoas doentes são demitidas, pois os empregadores, quase sempre, escondem ou contestam a relação entre o processo de trabalho e os acidentes e doenças sofridas por seus funcionários”, acentuou o docente.
 
“Os dados para a pesquisa são obtidos a partir de um acordo de cooperação técnica entre a UFBA e o Ministério Público de Trabalho, que concede informações de várias instituições públicas envolvidas na regulação do trabalho como o Judiciário, a Previdência Social e a Fiscalização do Trabalho”, contou o professor de Economia.  Os pesquisadores do projeto cruzam as bases de dados fim de “identificar benefícios previdenciários concedidos como se fossem decorrentes de doenças comuns (código B 31), mas cuja causa mantém relação com o trabalho e, portanto, deveriam ser enquadrados como auxílios doença acidentário (B 91)”, disse o especialista.
 
Quando o trabalhador recebe benefício B31, pode ser dispensado assim que voltar ao trabalho. Mas se o benefício for B91, o empregado tem estabilidade de um ano no trabalho contado a partir do fim do benefício. Ou seja, a empresa, por lei, não pode descartar o trabalhador que cuja lesão foi associada ao trabalho, mas, na prática, a ocultação do adoecimento torna essa estratégia extremamente comum e pessoas doentes são demitidas e sofrem com a impossibilidade médica de conseguir outra ocupação”, alerta o professor, destacando que um dos objetivos é transformar o auxílio B31 em B91.
 
No caso do setor de call centers, na Bahia, “os principais males que causam afastamentos dos trabalhadores são as doenças psíquicas como depressão e ansiedade, doenças osteo-musculares, disfonias (nódulos, rouquidão) e disfunção urinárias e de ATM e sobrepeso” enumerou o professor Eduardo Reis, da Faculdade de Medicina da Bahia, que esteve à frente do Serviço de Saúde Ocupacional do Hospital Universitário Professor Edgard Santos (HUPES) por mais de um década. Entretanto, nem sempre a doença é caracterizada como laboral e o afastamento pela Previdência Social ignora essa relação, devido à subnotificação.
 
Então, com o acompanhamento do projeto, “o trabalhador é entrevistado por uma equipe multidisciplinar (composta por médicos residentes e pesquisadores de direito, economia e enfermagem) e é traçado o seu perfil sócio-econômico.  Eles também recebem orientação jurídica e passam por exame clínico e o caso é analisado a fim de comprovar se existe tal relação para a composição de um dossiê (relatórios médicos e de outras instituições) com o objetivo de solicitar ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), a transformação do benefício. O dossiê também tem como finalidade subsidiar a atuação dos demais órgãos públicos, como o Poder Judiciário, a Fiscalização do Trabalho e o Ministério Público, explicou Filgueiras.
 
Os pesquisadores auxiliam o segurado na emissão da documentação que pode ser utilizada pelo trabalhador em eventuais demandas frente aos órgãos públicos e auxilia o Estado no planejamento de políticas públicas.  Ao longo de um ano de funcionamento, o projeto investigou 40 casos de trabalhadores, constatando a natureza ocupacional do adoecimento na grande maioria dos casos.  Além disso, o professor informou que o Serviço de Apoio Jurídico da Bahia (SAJU) da Faculdade de Direito da UFBA está iniciando o atendimento gratuito dos trabalhadores prejudicados, para o ingresso de demandas na Justiça do Trabalho.  O Projeto Caminhos Trabalho, cuja meta é tornar-se permanente na UFBA, realiza o atendimento de trabalhadores adoecidos às quartas-feiras, das 13 às 17h, no 3º andar do ambulatório Professor Magalhães Neto, no Canela. O agendamento pode ser feito pelo telefone 71 98193-4367.